Vitória dos servidores médicos para reenquadramento das aposentadorias e pensões

Vitória dos servidores médicos para reenquadramento das aposentadorias e pensões

Na última década, a carreira de Médico no serviço público do estado de São Paulo sofreu algumas alterações. Alguns anos atrás, por exemplo, a Lei Complementar nº 1.193, do ano de 2013, reestruturou a carreira de Médico no estado de São Paulo, estabelecendo 3 classes para ela, a saber: “Médico I”, “Médico II” e “Médico III”. E além de estabelecer estas 3 classes, tal norma acabou também por enquadrar todos os servidores desta carreira no nível inicial, qual seja, o de “Médico I”.

Um ano depois, com a promulgação da Lei Complementar Estadual nº 1.239, de 7 de abril de 2014, houve, dentre outras providências, a alteração da Lei Complementar nº 1.193/2013. E uma das alterações possibilitou a promoção dos Médicos com base exclusivamente no tempo de serviço.

Segundo a lei em questão, do ano de 2014, o único requisito para ser promovido de Médico I para Médico II ou III passou a ser, respectivamente, 10 (dez) e 20 (vinte) anos de efetivo exercício na classe.

Então, por força da entrada em vigor da Lei Complementar nº 1.239/2014, todos os servidores públicos ativos do estado de São Paulo, que ocupavam cargo de Médico e que tinham 10 (dez) ou mais anos de efetivo exercício na classe, foram automaticamente promovidos. Para tanto, foi computado o tempo de efetivo exercício nas classes de Médico e Médico Sanitarista prestado no serviço público estadual, mesmo que anterior à vigência da Lei Complementar nº 1.239/2014.

Entretanto, aqueles servidores aposentados e os pensionistas de ex-servidores, mesmo possuindo mais de 10 (dez) anos de efetivo exercício na classe, não tiveram considerado o efetivo tempo de serviço prestado para fins de promoção, permanecendo no nível inicial da carreira, em desigualdade de condições com os servidores da ativa.

A Advocacia Sandoval Filho, atenta às alterações legislativas, identificou uma irregularidade nesta conduta da Administração Pública Estadual, na medida em que deveria também ter assegurado esta “promoção automática” aqueles servidores que se aposentaram com direito à paridade remuneratória e que possuíam 10 (dez) ou mais anos de efetivo exercício na classe.

Tendo em vista a citada irregularidade, no ano de 2015, baseando-se no princípio constitucional da paridade remuneratória entre os servidores ativos e inativos, a Advocacia Sandoval Filho foi pioneira na defesa da tese de que, se o Médico em atividade pode ser promovido automaticamente e exclusivamente pelo tempo de serviço que tem, os aposentados e os pensionistas também podem.

Tal tese tem fundamento, além da paridade remuneratória, em precedente do Supremo Tribunal Federal que, quando se deparou com questão semelhante, no julgamento do RE nº 606.199 (Tema nº 439 de Repercussão Geral), decidiu, em suma, que, embora não haja direito adquirido à regime jurídico, tem de ser respeitada a irredutibilidade de vencimentos e observados os requisitos objetivos de tempo de serviço e de titulação, para fins de reenquadramento.

As ações judiciais propostas sobre o tema começaram recentemente a serem julgadas de forma definitiva. Felizmente, o segundo processo julgado de forma definitiva sobre o assunto, assim como o primeiro, teve o pedido julgado integralmente procedente. Confira os principais trechos da decisão proferida no mencionado processo:

  • “O recurso é procedente. No julgamento do Tema 439 de Repercussão Geral (Recurso Extraordinário 606.199), assim decidiu o C. STF: (…) Conforme se lê do referido julgado, o Supremo Tribunal Federal entendeu não haver ilegalidade na reestruturação da carreira, tampouco direito adquirido para aqueles servidores que se aposentaram na última classe da carreira de ocuparem também a última classe na reestruturação. Todavia, a corte entendeu que, havendo reestruturação, não poderia haver prejuízo àqueles servidores aposentados sob as regras da paridade, devendo eles ter o mesmo destino daqueles servidores da ativa a que são equiparados. Cito novamente:
  • “A regra constitucional da paridade, repito, não garante aos inativos somente o direito à irredutibilidade do valor nominal dos proventos e à revisão remuneratória geral dada aos ativos, mas sim às vantagens decorrentes de quaisquer benefícios posteriormente concedidos aos ativos, desde que baseados em critérios objetivos.
  • É dizer que, tendo sido aposentados na forma do Art. 6º da EC 41/03, tem eles direito a paridade de vencimentos, conforme EC 47/05, incluindo tal paridade o direito de ver “estendidos aos aposentados e pensionistas quaisquer benefícios ou vantagens posteriormente concedidos aos servidores em atividade, inclusive quando decorrentes da transformação ou reclassificação do cargo ou função em que se deu a aposentadoria ou que serviu de referência para a concessão da pensão”.
  • A norma constitucional reformadora, portanto, é clara no sentido de que, havendo transformação ou reclassificação do cargo, tem os servidores aposentados os mesmos direitos para enquadramento dos servidores da ativa.
  • No presente caso, todos os autores foram aposentados nos termos do Art. 6º da EC 41/03, sendo incontroverso o direito a paridade remuneratória. Em sendo assim, para que tal paridade seja preservada, seu enquadramento na reestruturação da carreira promovida pelas LCE 1.193/13 e 1.239/14 deve ser feito considerando-se um servidor da ativa com as mesmas condições que o servidor aposentado possuía quando passou a inatividade.
  • Desta forma, se, por exemplo, um servidor da ativa com 15 anos de serviço foi enquadrado como Médico II, o médico aposentado com 15 anos de serviço e direito a paridade deve ser enquadrado na mesma classe, sob pena de violação da paridade a eles garantida pela Emenda Constitucional.
  • Simplesmente enquadrar todos os aposentados na classe inicial retiraria deles completamente a garantia constitucional dada de reenquadramento na mesma condição dos ativos. No caso em questão o direito adquirido dos autores foi desconsiderado pois a promoção se deu apenas em razão do tempo na carreira, dispensada a avaliação de desempenho e títulos.
  • Assim, os médicos da ativa puderam alcançar classe superior, apenas em razão de critérios objetivos, enquanto os inativos ficaram estagnados, afrontando a regra constitucional da paridade. (…)
  • Do exposto, dou provimento ao recurso, para que os autores sejam reenquadrados nos termos do Art. 8º da Lei Complementar Estadual 1.239/14, considerando o tempo de serviço da ativa até a data das respectivas aposentadorias, desde que o referido tempo tenha sido exercido no mesmo vínculo, bem como condenar a ré a pagar as parcelas vencidas, a partir da vigência da citada lei complementar (…)”

Trata-se de uma importante vitória do servidorismo público paulista no Poder Judiciário, alcançada através de mais uma tese em que a Advocacia Sandoval Filho é precursora, sempre visando a observância dos direitos e garantias constitucionais aos servidores frente a injustificável e ilegítima conduta do Estado, que insiste na aplicação de política salarial tendente a excluir os aposentados e pensionistas.

Lucas Cavina Mussi Mortati
OAB/SP 344.044

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